Cinzas

17:46:00

Fechei os olhos e queimou.

Senti o cheiro do perfume tomando conta do ar. O barulho da rua tocava numa sinfonia só, a caçamba, o lixeiro, os carros e os motoboys, todos eles se tornaram entonações diferentes de uma mesma voz. Comecei a queimar.

Nas paredes as flores que não enviei começaram a murchar. Os vinhos que não tomamos se tornaram vinagre. As conversas, os domingos, o frio junto, tudo foi queimando. As ideias e pensamentos loucos, aquelas conversas e risadas extenuantes que nunca aconteceram, as filosofias que nunca se tornaram livros...

Levantei e liguei o chuveiro. Deitei e no dia seguinte a casa estava cheia de pó. Eram cinzas da noite em que queimei de saudade. Não pude conter a pequena fagulha que ficou aqui. E queimei.

Preso à minha hipocrisia de liberdade. Amarrado aos meus sonhos e dogmas. Mercadologicamente valioso, sentimentalmente vagabundo.

Aprendi a levantarr e vestir a roupa mais bem passada entre as amassadas e fingir que nada aconteceu. Entre queimaduras, ranhuras e saudades, permanecendo ou não, prendi-me à janela gigante da sala que se abre pra um mundo minúsculo.

Não chorei entre todos esses dias. Também pudera, se queimei não poderia exaustar-me em outro verbo. Imoral, sem escrúpulos, me rendi.

Ardor. Ardor. Ardor. Quarta-feira colorida, queimei de saudade e acordei na quinta em cinzas.

Fagulha. Explosão.

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