A hora chegou.

16:27:00

Como um defunto que falhou nas inúmeras tentativas de reavivamento, olhei e disse como qualquer doutor-sem-doutorado incrédulo: Não tinha muito o que fazer.

O corpo e sentimento se decompuseram na memória como um cadáver que adormece e é esquecido, levava junto de si as poesias, os rascunhos e os desenhos tremidos de histórias mal contadas sobre um romance que nunca saiu do papel, uma relação que nunca deixou de ser resumida em poucas palavras e alguns beijos ébrios.

Não tinha muito o que fazer.

Como tantas outras vezes, sem despedida ou fatalidade que o acometesse, foi partindo-se e desintegrando-se no ar. Eu só queria dizer adeus, mas não deu tempo, precisava ajeitar o apartamento, realizar algumas atividades no trabalho, gerenciar as crises de relacionamentos outros e no meio de tudo isso manter-me em pé com o sorriso de miss no rosto.

Eu tinha muito o que fazer.

Num mal súbito, como os do histórico familiar (e sentimental), foi embora. Não tinha muito o que fazer. Nem mil cargas de desfibriladores, nem murros heróicos sobre o peito, nem adrenalina na veia...era a hora, eu disse conformado.

Já nem conseguia ter pensamentos úmidos, já não imaginava os almoços de domingo ou a sua companhia na festa familiar que se aproxima. Há tantos abismos de distância que não sei se saberia construir essas pontes. 

Foi a hora certa. Nasceu, viveu e morreu. Enquanto esteve aqui proporcionou bons momentos, alguns desesperadores, alguns engraçados e outros muito enigmáticos. É a natureza de quem não sabe o que quer. E por não saber, descuidou- se. Entupiram-se as veias e um mal lhe acometeu.

Não tinha o que fazer. Foi preciso morrer para ser lembrado. Uma história traumática com cheiro de vodca barata e idas e vindas indecisas e inexplicaveis, um aeroporto alcoólatra, uma história engraçada, uma lembrança.

Alguma coisa resta? Agora não tem muito o que fazer.

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