Piracema.

16:34:00

A Venlafaxina tem tido êxito em todos os efeitos colaterais sobre o meu físico. Ânsias durante o dia, náuseas pela tarde e uma fraqueza tão perene quanto a garoa que cai lá fora. Tenho medo de ficar dependente dessa fraqueza tanto quanto estou do Zolpidem...um comprimido e menos de uma hora depois me encontro no sono mais profundo e revigorante que já tive em tempos. Ainda passo as noites, antes de dormir, desenhando e apagando no teto os rascunhos de um futuro que não vai acontecer. Carreira, casamento, filhos, viagens, discursos e vitórias. Nenhuma noite é reservada às doenças, aos atritos, às tristezas, às derrotas, não!, todas as noites são reservadas a um futuro brilhante e distante.

À medida que vou ingerindo essas drogas, sinto que uma fogueira acesa vai consumindo todas as memórias em papel e lápis. Já não consigo mais rasgar as folhas do pequeno caderno de desenhos com meus gizes de cera, sequer me lembro de como foi triste o dia em que as pessoas partiram e mais ainda, tento, a todo momento, trazer a pesada carga emocional daquele dia ruim que tive a fim de apagar as lágrimas que queimaram meu rosto pela vergonha, pela dor, pela depressão.

Estar doente me faz me ater mais aos meus instintos, aos meus sonhos, aos meus projetos individuais desenhados no teto escuro. É um investimento pesado em terapias, análises, medicamentos e alimentos diferenciados que, pesando no bolso, pesa minha consciência. Eu preciso ficar bem. Se não por mim, por quem se foi na fraqueza de não ter consigo. É preciso que eu continue hasteando, durante as pequenas vitórias, a bandeira daqueles que sonham demais, sofrem demais, amam demais e sobretudo: se excedem para não ser escassez. Eu posso ser tudo, mas eu não sou escasso...sou mais do que seu olho pode ver, só não desonre meu nome. 

Piracema: ir contra a corrente para sobreviver. É sobre isso que eu gosto de falar, amar, chorar, sofrer e sonhar: sobreviver.

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