Fulgor

17:36:00

Quando eu era criança os dias que antecediam meu aniversário pareciam mais ensolarados. Talvez fosse a extensão do horário verão ou  o aquecimento global que ainda não estava a todo vapor. Esses dias, por aqui, andam meio nublados demais.

Da janela da sala mal vejo o horizonte de prédios. Da janela do trabalho, olho e vejo uma paisagem muito triste, agoniante. Nunca fui desses que gosta de sol em demasia, mas aparentemente as coisas andam meio cinzas demais por aqui. Eu preciso de luz.

Luz é plenitude e compreensão. É perdão e aceitação. Eu preciso me iluminar, encontrar no meu interior as forças para aceitar aquilo que não posso controlar - as vontades alheias, os caminhos dos outros, os problemas diários e os dias nublados. Encontrar em mim mesmo a clareza de assumir meus sentimentos reais e confrontá-los com a realidade. Choro, lágrima, angústia e um medo constante andam acinzentando esses dias. 

Que vontade de ser criança de novo! 

Chegar da escola, tirar o sapato e assistir Chaves enquanto como um pão com qualquer coisa, enquanto o pai, na sala, assiste Gazeta Esportiva dando ordens...''Vá tomar banho! Tem tarefa pra amanhã? Vamos ao mercado! Vamos buscar sua mãe!''. Chegar da escola e esperar pelo fim de semana, pela feira de sábado, pelo domingo no sítio, pela angústia no domingo à noite que em comparação com a dos domingos atuais não é nada. 

Que saudade de ter medo de não conseguir fazer o trabalho de geografia!

Hoje a realidade é mais incisiva. As contas com prazo de validade. As ligações de telemarketing cobrando e oferecendo serviços. As mil obrigações, mil coisas pra fazer, a busca pelo agrado e satisfação geral, os passos atrás em nome da equipe, em nome do time, o anonimato em nome de todos. Tudo em nome deles, nada em meu nome.

A vontade é de ir trabalhar humanitariamente na Síria. Sentir a fome e o calor da guerra. Encontrar o perigo e eu mesmo, lado a lado, vivendo em tensão. E por mais exagerada que essa ideia pareça, eu tenho a impressão de que preciso sair em busca do ''algo maior'' que acredito piamente que a vida tem reservado pra mim e não sei o que é e onde está.

Preciso me organizar, olhar o planner, a agenda do outlook e marcar um horário para mim mesmo. Pra me encontrar, me confrontar e me enxergar nu em frente o espelho e sentir as marcas que estão escondidas nas camisas mal passadas. A escolinha já acabou, o pai está assistindo Gazeta Esportiva em outra sala, a mãe volta sozinha do trabalho.

O amor, a ansiedade, o medo e os furacões internos é que continuam iguais e acentuados. Todos eles precisando de luz. Quando eu era criança fazia mais sol nestes dias.

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