Recaída

17:34:00

Tenho escrito menos. Porque todas as vezes em que me lembro, é pra esquecer. 

Todas as vezes em que me lembro que preciso despejar em palavras, numa tentativa de fuga ou de alívio, tudo o que se passa aqui, por aqui, eu me lembro, ironicamente, que é pra esquecer.

E quando essas lembranças vêm, tão fortes como o vento frio do parque da Aclimação, eu fraquejo. Sinto o perfume por aí, na rua, no metrô, no elevador, na ponte sobre a 23. Sinto a textura da pele, dos cabelos perdidos em mim mesmo e esquecidos no meu lençol.

Eu sinto o esquecimento tomando conta das fotografias.

De costas para a janela, numa tentativa de romper o ciclo do Marlboro vermelho esperando o carro estacionar, as outras três cadeiras estão vazias. Trabalho, morada, paixão. Ninguém está aqui hoje.

Se por um lado preciso esquecer desse tempo, por outro me sinto feliz das outras órbitas em que me inseri. Mais protagonista, mais forte, mais questionador, por trás da camisa amassada ninguém sabe o coração latejante que existe, o cérebro brilhante lutando contra os narcóticos que produziu para si mesmo.

Arde ainda, não minto. Sinto saudades. Lembrei, nesses dias, durante a sobremesa, daquele comentário. Tão próximos e tão distanciados. Fraquejei naquelas mensagens, fiquei bêbado ali na esquina sentindo o perfume adocicado, dormi com um resquício de culpa.

Domingos solitários. Finais de semana em silêncio. Sinto falta de casa. 

Tanto pra dizer. Hoje lembrei diversas vezes e senti saudades. Lembrei mas porque era pra esquecer, não lembrei pra reaquecer.

Horas depois me encontrei queimando vivo. Que saudade d'ocê. Essa recaída de saudade é a pergunta mais dura: só eu ainda tento fazer disso esquecimento?

Que saudade d'ocê. Me deixa aguar. 

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