A palavra é meu objeto.

17:13:00

s.f. Vocábulo provido de significação. Faculdade natural de falar. Oração, discurso; pregação, doutrina. Arte da palavra, a retórica, a literatura. Dom da palavra, a eloquência. De palavra, que cumpre o que promete: pessoa de palavra. Só ter uma palavra, ater-se ao compromisso. Medir (ou pesar) as palavras, tomar cuidado no que diz. Dar palavra a, permitir (o presidente de uma assembléia) que alguém fale. Pedir a palavra, solicitar permissão para falar, ou o direito de falar. Direito de palavra, direito reconhecido a qualquer membro de corpo deliberativo de pedir e obter a palavra, nas condições previstas pelo regimento interno. S.f.pl. Promessas vagas, discursos vãos (por opos. a ações, obras). (V. VOCÁBULO.)

A palavra é meu objeto. Quão abjeta ela é pra eu querer resgatá-la em mim? Só sei que escrevo. E escrevo por que mil sessões de terapia não descarregarão meus gritos melhor do que a escrita. O desenho das letras sempre me encantou, fatiguei-me dele quando precisei fazer inúmeros exercícios no caderno brochura de caligrafia. Reencantei-me a posteriori. A palavra sempre fora parte de mim.

Há tempos não tive uma noite dessas, onde o cheiro do vinho rasga a mesa do jantar e na minha frente somente o meu reflexo no azulejo vintage. Eu e a palavra, frente a frente, num julgamento de ideais. Há quem escolha confrontar pessoas, há quem escolha confrontar ideias e há aqueles, como eu, que resolvem confrontar o nada. Eu sou só um Dom Quixote lutando contra os moinhos que transformam tantos sonhos em pó. Pobre de mim!

A palavra é meu objeto de estudo. Não a ciência política, a administração, a ciência social ou a sociologia. Escolhi ater-me à palavra. Ali, cruamente e cruelmente, longe de toda morfologia. Que dizem as palavras senão aquilo que eu quero? Elas são os cavalos que levam minha carruagem -ao céu, ao inferno, ao infinito, ao meu eu, e nelas me encontro e vejo quem sou: eu sou um nada. Não possuo propriedade física, intelectual ou sentimental. Sou um conglomerado de fracassos amorosos, financeiros e psíquicos que buscam, de alguma forma, a sua relevância no mundo. E quem me leva ao sério e me dá relevância senão a palavra?

A palavra amor, a palavra dor, a palavra saudade, a palavra perda, a palavra conquista, a palavra sucesso, a palavra nostalgia, a palavra portuguesa, a palavra inglesa, a palavra francesa, a palavra russa. Sempre a palavra que me pega pelas mãos, me coloca à mesa e questiona: O que te ocorre, garoto? E aí eu desmorono. Somente as palavras dos meus versos podem me julgar por conhecerem quem realmente sou e o que fez de mim o intemperismo da vida, somente elas, vestidas em suas togas, é que me dão o veredito final. Aqui, frente ao tribunal de contas do meu coração é que a palavra liberta, aqui onde as lágrimas tão ácidas queimam minha tez tão cansada, tão fatigada - de algo que ainda é nada perto do que está por vir -, aqui é onde meu coração sangra e se abstém de todo mal. Pela palavra eu me rendo, eu me curo, eu perjuro, eu mato, morro, crio meus personagens, meus poemas, minhas palavras. A palavra é meu objeto de amar.

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