Sobre medo e morte.

16:38:00

A maior crueldade da morte não é levar pra longe de nós as pessoas e seus significados, não é pôr fim e deixar o vazio. A maior crueldade da morte é diariamente nos assolar com doses mínimas de esquecimento. Esquecer quem amamos, esquecer quem esteve conosco, esquecer as memórias, antes tão marcantes, é pior do que a morte, é apagar capítulos que outrora foram importantes em nossa trajetória e nos moldaram até aqui, mas que por acúmulo de coisas, funções e sentimentos, se tornam irrelevantes.

Estava pensando sobre todas as pessoas que estavam comigo e se foram. Todos que, por ironia ou cordas, receberam o beijo da morte. É estranha a sensação e o medo de saber que posso esquecê-los da mesma forma que se fizeram presente na minha vida, é traumático saber que posso ser cruel ao ponto de esquecer quem me foi abraço nos dias necessários.

Tenho tido uns dias muito filosóficos, muito reflexivos, muito cheios de ideias e vazios de ações. Tenho visto como minha vida descarrilhou e não sei botá-la nos eixos novamente. Tenho tido medo, muito medo. 



Tenho medo de nunca mais poder voltar a São Paulo, independente como estou hoje, e viver como vivi e vivo. Tenho medo de que a vida das pessoas caminhe de tal forma - e isso é inevitável - que eu me torne, como os meus mortos, esquecível. Tenho medo de perder meus laços, minhas raízes necessárias e mais ainda: perder a única chance que tenho de ser feliz.

Antes de chegar a São Paulo eu sonhava em conhecer pessoas, lugares, ter sensações não vividas. Tive todas essas vivências. O mais traumático, entretanto, é que nesses últimos dias conheci uma das pessoas fantásticas que eu desenhava nas paredes da minha imaginação. E tenho medo. Tenho medo de estar indo por um caminho intangível que não corresponde ao que é tangível, tenho medo da distância, tenho medo de finalmente estar frente à grande chance de ser feliz - e não poder abraçá-la por depender de diversas outras variáveis. Tenho medo de estar à frente da felicidade mas não ter forças para abraçá-la por estar, ironicamente, morrendo enquanto vivo.

No fundo, em lágrimas e prantos, tenho medo de morrer na memória das pessoas. Tenho medo que São Paulo morra nos meus sonhos. Tenho medo de que meus próprios sonhos morram. Tenho medo de que parte de mim morra e eu fique cada vez mais desacreditado. Tenho medo de que a vida faça comigo, em troco ou carma, o que involuntariamente tenho feito com meus queridos mortos - tenho medo que pouco a pouco esqueçam também que eu me fui.

Fico triste como a vida caminha adiante e a morte é um ponto final. Neste momento, parece que eu também estou morrendo e o pior é ainda estar vivo.

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