Silenciar.
    Quando a porta da saída é a mesma da entrada. Quando dizer adeus exige dizer a Deus o que se quer. E o que se quer nunca se concretiza. Dizer adeus é sacrifício, é colocar no altar o único filho e descer-lhe o punhal pela convicção de que é a coisa certa a se fazer. É terminar o que Abraão não conseguiu.
     Há momentos em que eu não me pergunta nada, assim, esporadicamente, porque minha vida é, além de uma sucessão de erros e fracassos, uma sucessão de questionamentos: Mas como? Por que? Onde? Será? E se? Nesses raros momentos é que não compreendo nada, apenas contemplo como acontece. A vida acontece ali, aqui ou lá e nos resta ser inertes a ela sem o menor controle sobre as rédeas que achamos que seguramos. ''Da minha vida eu que sei!'' Não, não sei, apenas faço o que acho que sei que estou fazendo.
      E quanto mais descrente somos, mais fixos na crença do nada nos tornamos ao ponto do fanatismo nos engolir e nos inflar dentro de nós mesmos como balões que por sua natureza hão de subir: e a pressão atmosférica que nos estoura? A consequência nunca é um ponto considerável.
Me lembro das primeiras vezes, dos primeiros sentimentos que previam uma eternidade dentro de um limite de tempo. A porta da entrada é a porta da saída. Os contos de fada não são bonitinhos, são tragédias adocicadas para os lábios menos resistentes.
       Quem é quem nessa vida senão ninguém dentro do corpo de alguém? Ou seria o inverso?
O espelho d'alma acaba mostrando quem somos, nunca quem poderemos ser. A eternidade é feita de pequenos momentos com o respaldo de parar os relógios. Quando se vê, já acabou o tempo. Quando se vê os punhais já estão cravados no peito. Quando se vê acabou. Quando se vê estamos trancando a porta que outrora foi entrada e hoje é saída. Quem entra tem, por obrigatoriedade, que sair em algum momento - só não há volta quando se tranca a porta. E eu escolhi trancar. Silenciar, parar de se perguntar, só contemplar.