A equidade de gênero e a Constituição Brasileira

13:39:00

O poder, infelizmente, é homem, branco, rico e hétero.”
(Ideli Salvati, Ministra dos Direitos Humanos).



O preâmbulo da Constituição nos dá uma aula do país que ainda não temos, do país que ainda não conseguimos tirar do papel, das nossas dificuldades de se fazer valer os direitos dos cidadãos. Nos termos da lei, tem-se: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida (...)”. Se analisarmos estas prerrogativas sob a ótica da mulher, veremos que há ainda muito por fazer.
A Representatividade da mulher na vida política, por exemplo, ainda se dá de forma muito incipiente. O movimento e os coletivos feministas têm trabalhado duro na luta pela inserção da mulher na cidadania, pela conquista de seus direitos mais básicos. Mas ainda esbarram num meio excessivamente dominado por homens, pela lógica machista e misógina. Não nos faltam dados que comprovem que a participação da mulher na política não se realiza por falta de vontade de realizar o que a própria Constituição estabelece.
Na revista “Apartes” da Câmara Municipal de São Paulo, referente aos meses de Março/Abril deste ano, há uma série de dados bastante interessantes, que ressaltam exatamente esta disparidade de direito à participação ativa da mulher no âmbito da política. Nela se enfatiza o quanto o caminho a percorrer ainda é longo: 90% das cadeiras Legislativas do Brasil estão preenchidas por homens, o que coloca nos coloca como um dos países com menor participação de mulheres no Parlamento.
Uma tentativa de mudar esse cenário ocorreu com a criação de cotas, por meio de Leis, como a 9.100/ 95, que estabelecia uma cota mínima de 20% das vagas para candidaturas de mulheres, e a Lei 9.504, que aumentava esse percentual para 30% (para candidaturas de cada sexo). O senso comum diz que no Brasil há leis que “pegam” e outras que não “pegam”. Neste caso, o senso comum está mais do que correto, pois ambas não “pegaram”. Nas eleições municipais de 2008, por exemplo, o número de candidaturas femininas foi de 19,84% do total. Isso nos mostra, que uma política de cotas não é a única solução. É necessário que os próprios partidos invistam em suas candidatas. Não dá pra aceitar que na Câmara Municipal da maior cidade do Brasil as mulheres representem apenas 10,9% do número de vereadores. Não me parece aceitável que de 513 cadeiras do Congresso Nacional, 9% seja o número de deputadas, número semelhante ao encontrado no Senado, onde há 81 cadeiras e apenas 12 pertencentes a mulheres. Paradoxal pensar que, mesmo nesse contexto, conseguimos eleger uma mulher pra presidência.
Mas qual a razão desse déficit se somos maioria populacional, não deveríamos fazer valer esse número nos cargos de poder? Segundo Isadora Brandão Araujo da Silva, advogada e integrante da Comissão dos Direitos Humanos do Sindicato dos Advogados de São Paulo e da Marcha Mundial das Mulheres, a busca por essa resposta deve ser buscada no contexto social, no qual a “política é fruto de um sistema patriarcal caracterizado pelo monopólio do poder político, militar e econômico nas mãos dos homens, assegurado mediante o controle físico e ideológico exercido sobre o corpo e a vida das mulheres nas esferas privada e pública. Há, portanto, um cenário de desvantagem econômica e de inferioridade simbólica das mulheres, que se materializa em condições díspares de acesso e participação nos processos políticos; e o abismo é ainda maior em relação às negras e indígenas.”
Voltando ao texto da Constituição, homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, mas nem sempre, principalmente quando se trata da parcela que não detém o poder, isso é respeitado. O acesso das mulheres às instâncias e às decisões políticas é parte fundamental do processo de empoderamento, consequência da luta diária de e da busca pela autonomia, tanto no âmbito político, como no social, de milhares de mulheres. O Estado tem dever de garantir a efetividade de suas leis. Quanto às mulheres, elas continuaram cobrando, indo às ruas, fazendo muito barulho. Tudo para que seus direitos sejam respeitados.




Jamille K. S. Souza (Estudante de Gestão de Políticas Públicas –Escola de Artes Ciências e Humanidades – EACH - USP).


Referências:
BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado, 2014.
Direitos Humanos no Brasil 2012. Relatório da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos. (www.social.org.br).

Revista “apartes” da Câmara Municipal de São Paulo. Número 6-Março/Abril de 2014.

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